cansada da mulher durante o dia à tarde meus olhos ardentes procuram o teu rosto. apetece um ombro a cheirar a terra. da terra vou sabendo o nome inteiro. de ti lembro o verde, o castanho, o ouro. com os olhos rasos de lágrimas entrego-me a um choro quente e febril. sem te encontrar à noite deito-me ao pé do teu retrato e entro no sonho como num bosque escuro.
A vida é feita de nadas:
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas
Pelo vento;
De casas de moradia
Caiadas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;
De poeira;
De sombra duma figueira;
De ver esta maravilha:
Meu Pai a erguer uma videira
Como uma Mãe que faz a trança à filha.
Miguel Torga
A tua beleza submerge-me, submerge o mais fundo de mim. E quando a tua beleza me queima, dissolvo-me como nunca, perante um homem, me dissolvera. De entre os homens eu era a diferente, era eu própria, mas em ti vejo a parte de mim que és tu. Sinto-te em mim. Sinto a minha própria voz tornar-se mais grave como se te tivesse bebido, como se cada parcela da nossa semelhança estivesse soldada pelo fogo e a fissura não fosse detectável.
Anaïs Nin. A casa do incesto
Então soubemos
a via transparente,
a luz reveladora,
a meta incandescente!
Silenciemos agora...
Adormece nos meus olhos
e deixa que entre
a alvorada acolhedora.
(Amor jura que vens ter comigo
mais logo, no limiar da noite,
para eu semear o teu caminho de flores)
Não gosto dos fins a saberem a fim
Não gosto da suspensão suspensa
Como eu te sonhei
Como eu te amo
- Meu Amor -
Deslizas-me
Ocorres-me
Transpareces-me
Lentamente
devagarinho
a brisa num sussurro
"Como a vida é breve
Para soletrar o mundo
e o teu corpo
Também eu
Quisera amar-te
Em forma de rondó..."
Alma minha gentil, que te partiste
tão cedo desta vida descontente,
repousa lá no céu eternamente,
e viva eu cá na terra sempre triste.
Se lá no assento etéreo, onde subiste,
memória desta vida se consente,
não te esqueças daquele amor ardente
que já nos olhos meus tão puro viste.
E se vires que pode merecer-te
algua coisa a dor que me ficou,
da mágoa, sem remédio, de perder-te,
roga a Deus, que teus anos encurtou,
que tão cedo de cá me leve a ver-te,
quão cedo de meus olhos te levou.
Luis de Camões
(para o Nilson)
Fotografia: Mar
Os meus links