Atravessámos a planície navegando onde o vento era fraco
e as flores da primavera tomavam estranhos coloridos
até sermos cercados pela terra.
À nossa volta
sobre nós
sobre cada coisa
ouvíamos sons imperceptíveis...
Dormimos por instantes sobre o cheiro da erva esmagada
sobre o morno da tarde
agarrados um ao outro por sonhos de roxo pincelados.
Transbordante é o dia!
Transbordante é o roxo!
Fotografia: Mar
Preciso que algo desabe e se revele: a beleza enorme da coincidência, a estonteante geometria da sorte...
e, mais tarde,
mais cedo,
mais depressa,
mais longe,
as coisas cairão sobre si, desarticuladas, exaustas de poesia, inúteis. Alguém virá então e recolherá os destroços. Como lenha. E as coisas terminadas da primavera deixarão mais uma vez de estar terminadas. O ciclo recomeça. No fim completo do silêncio dos corpos.
Fotografia: Mar
Quem pode impedir a Primavera
Se as árvores se vão cobrir de flores
E o homem se sentiu sorrir à vida?
(...)
Quem pode impedir a Primavera
Se estamos em Maio e uma ternura
Nos faz abrir a porta aos viandantes
E o amor se abriga em cada um dos nossos gestos!
Quem?...
Se os sonhos maus do Inverno dão lugar à Primavera!
Ruy Cinatti
Acaricio o branco
cheiro a campo
Sorriso lunar
Claras envoltas
nas rimas intermitentes
deste fim de tarde sonante de prazeres e amores
por isso....
invisto-me no arco-iris
que invento
nos segredos
nos odores
nos sabores
nas imagens
...
Acaricio o branco
cheiro a campo
Mar
(...)
Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti que tudo canta ainda?
Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.
(...)
Eugénio de Andrade - Pequena Elegia de Setembro
Desperto com a melodia da cotovia
a baloiçar no peitoril da janela.
Abro a vidraça de par em par
e inspiro o ar da brisa matinal.
Desponta a aurora em cor e luz,
o sol acorda e a flor sorri...
Ouço o canto do vento
bailando ao som da água corrente.
Numa explosão de sentimentos
redescubro a beleza do amanhecer!
Obrigado Isa pela gentileza de semear tão linda poesia
Quem me espera não me espera
quem me ama já esqueceu
quem me toca dilacera
que estranha Primavera
que o mês de Maio me deu.
Eu já nem sei o que tenho
se febre se mal ruim
se este sentimento estranho
de não ser de aonde venho
comigo longe de mim.
...
António Lobo Antunes
Somos como árvores
só quando o desejo é morto.
Só então nos lembramos
que Maio traz em si a Primavera.
Só então, belos e despidos,
ficamos longamente à sua espera.
Eugénio de Andrade language=javascript>postamble();
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